quarta-feira, 2 de fevereiro de 2022

Aconteceu comigo

 Em 2014, fiz uma viagem solitária de 80 dias pela Europa, num triciclo.



Relato aqui um dos inúmeros eventos que vivenciei.

No 22o dia saio de Alfta em direção a Asarna.

Optei por uma rota pouco usual: pegar a rodovia 296 em vez da 83. 

Queria passar pela zona rural, madeireira.  Valeu a pena?  Segundo o poeta:

"Tudo vale a pena

Se a alma não é pequena”.

Muito verde, Num trecho fiquei mais de 1 hora sem ver uma alma viva! Nenhum carro cruzou comigo neste período e para complicar, a qualidade daquela estrada secundária tinha o padrão brasileiro de buracos…

Finalmente, vi uma placa, "Välkommen till Los”. 

Pensei comigo mesmo “graças a Deus, vou parar,  tomar um café quente e encher o tanque de gasolina, que já estava com menos de 1/4”.

Doce ilusão.

A cidadezinha tinha uma bonita igreja (fotografei), umas 20 casas, mas nenhum posto de gasolina …

Rodei mais uns 20 km e finalmente encontrei um posto. 

O interessante foi que, pouco depois que abasteci, um caminhão de 8 eixos carregado de toras de madeira parou na bomba de diesel do outro lado. O motorista desce. Era uma loira que parecia ter uns 20 poucos anos. Fiquei impressionado. Pensei comigo:  "Aqui é a Suécia mesmo. Uma pessoa tão jovem dirigindo um caminhão deste tamanho”. 

("Eta pensamento machista" sussurra Simone de Beauvoir no meu ouvido).

Acho que olhei demais. De repente, em voz alta, na frente de todo mundo, ela diz:

"Hey, grandpa. Where did you come from with this trike?”

Respondi: "Germany".

"Volkswagen engine?”

"No, Ford, 1,4 liters".

"Cool. Have a nice trip, grandpa”.

Ela me chamou de vovozinho!!! 

Ela disse isso para me humilhar? Se foi isso, ela foi muito educada. Poderia ter dito:  “Tá olhando o que, meu?”

Não estava interessado nela. Só estava confirmando que neste país não existe trabalho típico para homem ou mulher… 

Pelo trajeto vi mulher dirigindo trator, ônibus, taxi, mulher pintando muro… Muito antes dos americanos ou de nós, eles trabalharam para acabar a desigualdade de gênero no mercado de trabalho.

Finalmente, chego em Åsarna. 

E ESTE É O PONTO QUE INTERESSA E GOSTARIA DE CONTAR:

O Hotel "Big Moose" (que reservei no Brasil) estava fechado. Nenhum carro lá fora. Uma aviso colado na porta dizia para ligar para um determinado número. Liguei. 

DEPOIS DE UNS 10 MINUTOS APARECEU, DE CARRO, A ATENDENTE, ENTREGOU A CHAVE, COBROU E FOI EMBORA. SIMPLES ASSIM.

Eu era o único cliente hoje. Isto provavelmente não aconteceria no Brasil. Deixar um desconhecido SOZINHO no hotel com tantas bebidas no barzinho, TV e aparelho de DVD nos quartos…

Já no quarto, uma placa em inglês dizia que, na recepção não ficava ninguém a noite. Recomendava não esquecer de trancar a porta da recepção do hotel ao sair. 

Claro que o restaurante não funcionaria naquele dia. Rodei uns 2 quilômetros para encontrar um local para jantar. 

Comi salsicha de Fulan, típica da Suécia, com purê de batatas. Confesso que não gostei, mas era a melhor opção disponível.  

Na manhã seguinte, ao levantar pensei: 

“Dancei, vou ficar sem o café da manhã que estava incluso no preço!”.

Mas, um pouco antes da minha saída do hotel, chega a atendente. Ela trouxe uma bandeja com suco de laranja (aqueles em caixinha), café numa cafeteira, iogurte, pão e frios… 

Eu fui mesmo o único hóspede do hotel !!!

E a única pessoa que passou a noite no hotel.

UM DIA CHEGAREMOS A ESTE PONTO DE CONFIAR NAS PESSOAS ?


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