terça-feira, 4 de maio de 2010

Meu avô e o pedaço de pão.


Hoje faz 40 anos que meu avô Caetano morreu.

Era um grande homem. Autodidata, apaixonado por Fernando Pessoa, o primeiro ateu que conheci... Marcou minha vida pela sua sabedoria e pela sua opção de vida simples. Foi com ele que aprendi o significado da expressão: "Carrego comigo todos os meus bens!".

Lembro-me de como eu gostava de passar férias em Americana no seu sítio. Ele me levava para longas caminhadas... Deitados sob os pés de mexerica, ele contava histórias de sua infância, enquanto eu admirava as nuvens brancas se movimentando sobre o azul do céu... Quem tem tempo para isto, hoje?

Nestes passeios aprendi a gostar de caminhar e aprendi a admirar os detalhes das trilhas... Com sua presença, coisas simples tornavam-se interessantes: uma pedra, uma flor, um bicho morto, uma simples taturana... Tudo para ele tinha significado...

A noite, deitados na rede, olhávamos para o céu e admirávamos as estrelas. Suas estórias me faziam viajar pela possibilidade da existência de vida inteligente em algum lugar daquela imensidão do espaço... Nunca as estrelas foram tão brilhantes...

Ele dava pouca importância para o que chamava "pequenez dos sentimentos inferiores das pessoas". "Luiz" , ele me dizia, "quer ser feliz, aprenda a não ter inveja, nem odiar ninguém... Tudo é passageiro."

Ele me contou uma história, que contei um dia para meu filho e espero que ele conte para os filhos dele:

Certa vez, no exercito, viajando há horas, meu avô estava cansado e faminto. Faltavam ainda muitas horas para chegar ao seu destino. Foi então que cruzou com um velho que lhe deu um pequeno embrulho. Aqui, meu filho, disse o velho, tem um pedaço de pão muito bem embrulhado. Este é seu tesouro. Não abra e não o coma agora. Agüente firme. Só quando achar que realmente não vai agüentar mais, em último caso, só ai, você pode abrir. Lembre-se esta é sua salvação. Quando sentir fome, ponha a mão no bolso e sinta que você têm um pedaço de pão. Fale prá você: "Vou agüentar mais um pouco". Tente chegar ao seu destino com ele e passe-o para outra pessoa. Tem quem precise dele mais que você.

E assim, meu avô diz que fez. Viajou por horas e horas com fome. Colocou a mão no bolso inúmeras vezes e resitiu a tentação. Toda vez escutava o velho dizendo... "só abra quando não estiver agüentando mais".

Chegou ao seu destino. Graças ao"seu tesouro" teve força para continuar. A grande surpresa veio quando descobriu que dentro do pacote tinha só um pedaço de madeira...

"Luiz, todos precisamos de um pedaço de pão no bolso para agüentar a caminhada quando ela ficar difícil... Tenho certeza, você consquistará o seu."

Meu querido, avô. Obrigado.