quinta-feira, 10 de fevereiro de 2011

Meu avô, o empreiteiro e os catadores de laranja


Só tenho boas recordações de meu avô Caetano...

Na adolescência, eu costumava passar as férias em Americana. Me lembro bem da sua casa branca caiada de telhado vermelho, da varanda enorme que circundava a casa toda, do terreno cheio de flores e dos canteiros de couve, de alface e cenoura, do pequeno galinheiro e a em grande destaque, o poço com sarilho de madeira. Como eu gostava de tirar água do poço só para sentir aquele momento mágico de jogar o balde no vazio e, segundos depois escutá-lo tocar no fundo escuro. E, depois fazer um esforço enorme para rodar a manivela daquela velha roldana com catraca...

Meu avô era um daqueles autodidatas, que lia almanaques de farmácia, Seleções e tudo que caia em suas mãos sem nunca ter estudado além do primário. Gostava de Mozart num ambiente onde só se ouvia música sertaneja... Preparava seu cigarro de palha como se fosse um ritual religioso, mas dizia que era para eu ficar longe deste vício “maldito”...

Ontem me lembrei dele.

Contratamos um empreiteiro para reformar nosso apto. Ele tem várias frentes de trabalho. Um grupo que quebra parede e piso, depois tira o entulho e sai de cena. Ai entram os que cuidam da hidráulica e da elétrica. Na sequencia entram outros, do acabamento das paredes (com gesso) e da colocação do piso. Cada grupo recebe em função de um indicador de atividade, metros lineares de rodapés tirados, área de piso removida, sacos de entulho colocados na caçamba e assim por diante. Os vários grupos não formam uma equipe. Existem vários grupos que executam a mesma atividade. Nem sempre um grupo conhece o grupo que virá depois dele. Mas, todos trabalham em função do seu indicador de desempenho e remunerados por ele.

Consequências deste modelo: “Faço minha parte e vou embora”. Sem boa coordenação dificilmente surge a preocupação com o processo todo ou com o cliente interno.

Acontece algo semelhante ao que meu avô me contou quando trabalhou como catador de laranjas. O fazendeiro pagava por caixa de laranja colhida. Todo mundo queria pegar as que estavam mais em baixo. Aqueles que tinham que pegar as laranjas mais altas eram prejudicados. No caso do empreiteiro algo semelhante ocorre. O grupo anterior, visando maximizar sua performance, acaba deixando “rebarbas” para o grupo seguinte. “Retirei 100 metros de rodapés. Recebi por 100 metros. Se a parede ficou irregular, o colocador de rodapés resolve depois...”.

Maximizar as partes, não significa maximizar o todo.

O todo é maior do que a soma das partes. As interações são importantes!

Meu avô descobriu isto catando laranjas... O empreiteiro ainda não...